segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Mulheres de preto.




Decidi que quero fazer um curso de operações especiais. Um curso pauleira desses do COT, do BOPE, do CORE, sei lá, qualquer um serve. Me disseram que esses cursos trabalham bem a parte emocional da pessoa, a resistência psicológica e física. Decidi que quero ser caveira! Porque caveira que é caveira de verdade nunca se rende. É disso que eu preciso, porque estou cansada. Quero ter um coração bombado, daqueles que nunca se entregam e nunca te traem. Um coração endurecido feito pedra pra nunca mais me apaixonar por homem nenhum nesse mundo.

É bem verdade que sempre critiquei esses cursos onde o aluno apanha e é humilhado pelos instrutores. Palhaçada isso de raspar a cabeça. Dizer que "o que não me mata me fortalece" sempre me pareceu propaganda ideológica do sistema. Nunca gostei de Nietzsche. Agora mudei de ideia. Quero fazer um curso da-que-les onde o pau quebra, onde rola solta a pancadaria. Dignidade pra quê, né? Como se pudesse existir algo pior do que acordar de madrugada e não poder sentir você dormindo ao meu lado. Eu quero apanhar na cara e sentir gosto de sangue na boca, se isso me ajudar a esquecer seu gosto de vez. É o caso clássico de levar uma surra pra deixar de ser otária. E de pensar que eu me achava inteligente quando você ria das minhas piadas sarcásticas, irônicas. Descobri que a piada era eu... Meu coração é traiçoeiro e mais uma vez conseguiu me expor ao ridículo. Entenda, coração, que se é pra sofrer quero sofrer bonito. Por que não? Preto sempre me caiu muito bem. Faca na caveira!

Quando eu era pequena e sentia dor de cabeça eu deitava no colo da minha mãe e ela colocava uma das mãos sobre os meus olhos e fazia uma oração pra Deus. Aí era só esperar um pouquinho que a dor passava. Não sei o que houve, mas hoje o colo dela não me cabe mais. E nada do que ela me fala resolve coisa nenhuma. Agora perdi o teu colo também. Você sempre soube aliviar as minhas dores. Preciso fazer um curso onde eu experimente outros tipos de dor pra esquecer esta. Quero apanhar até perder a consciência, quero apagar. Até esquecer que você me chamava de "florzinha". Quero apagar da memória o timbre grave da tua voz cantarolando neste apartamento. Eu tô cansada demais. Quero apagar agora! Nenhuma ralação em treinamento deve ser pior do que pensar que acreditei que você me amava. Não pode ser pior do que você ligar pra sua melhor amiga às duas horas da manhã dizendo que você está sentindo uma dor insuportável ao respirar e ela mandar você dormir porque precisa acordar cedo no dia seguinte.  Hoje chorei no único ombro que me apareceu. Aquela que me persegue aqui na delegacia foi quem se esforçou pra me consolar quando explodi em lágrimas de desespero. E eu que jurei que essa mulher jamais me veria chorar. Não deu pra segurar! Ela percebeu, me chamou e perguntou. Não soube o que responder, mas ela já entendeu tudo. A que nível eu cheguei?  É por isso que eu digo que esse sofrimentozinho de treinamento é "fichinha" perto da falta que me faz a tua perna jogada em cima de mim e os sons que você fazia quando me amava, e me invadia, e me acalmava. Quero apagar agora, porque não suporto mais isso.

Eu tento, mas esse final de semana foi crítico. Liguei pra um grande amigo e pedi pra ele sair comigo. É uns quinze, vinte anos mais velho que eu e me conhece desde meus onze anos. É meu confidente, contei tudo pra ele. Olha... a minha carência afetiva pareceu-me tão preocupante que mesmo que nunca-antes-na-história-deste-país eu tivesse sentido qualquer sinal de atração física por ele, a gente quase ficou no sábado! Inacreditável, mas se ele me desse um único sinal de que estava a fim de se aproveitar da situação acho que eu teria deixado rolar. Porque eu tava muito afim e com muita raiva, mesmo. Medo. Nunca fui de ficar pra afogar as mágoas. Acho muito fraco esse tipo de mulher. Já sei que estou a perigo e que preciso me proteger... Maldito feromônio! Escuta aqui, mas escuta bem, vou raspar a cabeça e pintar a cara de preto. Quero ser caveira!

No domingo, implorei ajuda a uma grande amiga de adolescência que adoro e que testemunhou a nossa história desde o início. Nós duas até namoramos os mesmos caras (não ao mesmo tempo, claro, né!). Tanto é que ela tá casada com o meu primeiro namorado.  Saímos pra conversar. Eu tinha certeza que se alguém nesse mundo poderia me ajudar a passar melhor por isso era ela que me conhece, talvez, até melhor que eu mesma. A gente pediu suco de abacaxi com hortelã. Zero açúcar, zero álcool e zero calmante até o momento. Quando ela tocou com habilidade cirúrgica no ponto nevrálgico da minha dor eu me calei. Senti que a coisa seria mesmo sem anestesia. Me lembrei qua a única vez que vi minha mãe de porre foi por causa do meu pai. E me senti íntima de todos os bêbados e noiados que já desprezei pela vida afora. Me deu vontade de abraçar a cada um e dizer "eu te entendo, meu amigo". Não consegui dizer nada, não consegui chorar não consegui olhar pra ela, não consegui esboçar nenhuma reação. Colei as placas! Travei nas quatro rodas... E ela foi super amorosa comigo, mas não adiantou nada porque eu não consegui deixar que ela me ajudasse.  Tava doendo demais. Ela entendeu que precisava encerrar a "sessão" (Hum rum... ela é psicóloga). Antes de ela descer do carro, a gente se despediu, ela me abraçou, tadinha, e chorou comigo. Eu vim embora. E essa porcaria dessa dor veio no carro comigo.

Meu pai vai soltar foguetes quando souber. Você não era o tipo de cara que ele sonhou pra mim. Nosso relacionamento faz parte dos motivos pelos quais ele se decepcionou com a família. Não quero nem ver o meu pai. Ele vai jogar na minha cara toda a indiferença com que reagi quando ele se separarou da minha mãe. Fui rasa nesse dia como quem diz "eu te avisei, pai, a culpa é só sua". À época isso me parecia tão verdade, hoje eu já nem sei mais. Ele vai me perguntar onde foi que a "dona da verdade" a "expert" em vida a dois falhou. E essa é a pergunta mais difícil de toda a minha vida. E eu vou ter que reconhecer que eu não sou diferente dele. Que nenhum de nós dois sabe manter um relacionamento e que tenho mais do meu pai em mim do que eu gostaria de ter. "Tá bom, pai, você venceu e a princesinha aqui falhou". Somos dois fracassados e ainda não tenho ideia de como vou explicar isso para o "Pequeno Terroristazinho" quando ele me perguntar.

Meu chefe perguntou se eu precisava de umas folgas. Mas folga pra quê? Pra ir chorar em casa? Já tenho a madrugada toda pra chorar. Mas bem que ele poderia me mandar para os confins da Amazônia pra eu fazer um curso de sobreviência na selva! Sei que sou 100% operações urbanas (tradução: desculpa gente, mas não gosto de roça, não gosto de cobra, não gosto de inseto e evito pisar em cidade onde não tem Mac Donald's). Mas agora quero fazer um curso de sobrevivência na selva. Onde eu não possa encontrar nenhum papel contendo a sua letrinha executiva. Não acho ambiente pra mim. Não consigo respirar, porque doi. Esse bando de caveira de preto, careca e bombado deve ter algum segredo. Deve ter algum sentido maior em tomar porrada, passar fome, frio e medo até a exaustão, até conhecer o seu limite e apagar. Deve ser um alívio apagar. Não quero sentir mais nada, só um pouco de alívio. Quero esquecer o jeito como você promovia os pratos que preparava para que eu resolvesse comer nem que fosse só um pouquinho. Quero me empanturrar de  raízes amargas. Quero aprender a sobreviver sozinha. Porque amarga é a falta violenta que sinto da sua barba, de te puxar impaciente pela gravata, da sua força apertando o meu braço. Me faz mal essa vontade ardente de escalar o teu corpo e de desaparecer do mundo embaixo de você. Mas agora é comigo. Eu vou sobreviver sem você, pode apostar. Vou raspar a cabeça e pintar a cara de preto. Combina demais comigo.

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Duelo de titãns.

- "O senhor é o policial que vai embarcar armado?" Detalhe: Todo mundo na fila ouvindo à porta da aeronave.
- "Sim, obrigado por perguntar". Respondeu o policial, ironicamente.
- "O senhor conhece a legislação sobre o tema?". Insistiu o comandante indiscreto.
- "Conheço, claro". E a fila aguardando...
- "A sua arma já está desmuniciada?" Todo mundo olhando para o policial.
- "Está municiada, mas não está carregada".
- "Como assim? O que isso significa?"
- "Significa que eu entendo de armas e o senhor de aeronave. Passar bem".

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Precisão.

Fiz uma besteira enorme, enorme, enorme de grande. Um verdadeiro fiasco que não sei se classifico como humorístico ou dramático.  E por muito, muito, muito pouco eu não respondi a uma bronca daquelas que poderiam ter-me custado o emprego. Essa foi por um triz... Ainda não adquiri essa habilidade para dosar com exatidão a medida de energia necessária pra cumprir uma missão como convém. Exagero quando não é preciso e deixo a desejar na hora em que realmente tenho que agir com energia.  Pelo menos é o que ouço dizerem, ora num sentido ("Pô, Novinha, deixa o moleque"; "Calma moça, também não precisa apelar"); Ora noutro ("Novinha, você me parece ainda muito tímida"; "Novinha, aquela sua postura demonstrou submissão. Não pode!"),  E por aí vai... Resultado: Sei não. Será que estou exagerando?  Não sei precisar. Contudo, esse incidente não vai constar na minha ficha pessoal. Estúpida e livre, ganhei uma segunda chance e mais que um aviso urgente: o poder machuca.
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Tá, mas eu vim por outro motivo. Após deliciosos 15 dias de hospedagem e regalias lá no Blog da Priscila a gente encerra a festa com um texto inédito. Meus agradecimentos à Pri e aos queridos amigos que nos visitaram lá e se divertiram com as nossas brincadeiras. Priscila, minha linda, você só se esqueceu de responder àquela pergunta que te fiz por email: "Que palavras a gente usa pra agradecer nessas horas?" E para o querido leitor tenho outra pergunta: Qual é a diferença entre uma mulher normal com TPM e uma mulher policial também com TPM? Te respondo no Blog da Pri.

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Salmo calibre 91.


O texto a seguir é de um guerreiro israelita bastante experiente que viveu muito tempo antes de Cristo. Não sei se é um poema ou se é uma música, mas é conhecido como Salmo 91. Claro, que minha parte preferida da história do autor deste texto, é quando ele, ainda muito novinho, voluntariamente, enfrentou o abusado gigante Golias e o derrotou com uma arma caseira! Faço minhas as palavras do grande guerreiro Davi.

"Aquele que habita no abrigo do Altíssimo e descansa à sombra do Todo-poderoso pode dizer ao Senhor: Tu és o meu refúgio e a minha fortaleza, o meu Deus, em quem confio. Ele o livrará do laço do caçador e do veneno mortal. Ele o cobrirá com as suas penas, e sob as suas asas você encontrará refúgio; a fidelidade dele será o seu escudo protetor. Você não temerá o pavor da noite, nem a flecha que voa de dia, nem a peste que se move sorrateira nas trevas, nem a praga que devasta ao meio-dia. Mil poderão cair ao seu lado, dez mil à sua direita, mas nada o atingirá. Você simplesmente olhará, e verá o castigo dos ímpios. Se você fizer do Altíssimo o seu refúgio, nenhum mal o atingirá, desgraça alguma chegará à sua tenda. Porque a seus anjos ele dará ordens a seu respeito, para que o protejam em todos os seus caminhos; com as mãos eles o segurarão, para que você não tropece em alguma pedra. Você pisará o leão e a cobra; pisoteará o leão forte e a serpente. "Porque ele me ama, eu o resgatarei; eu o protegerei, pois conhece o meu nome. Ele clamará a mim, e eu lhe darei resposta, e na adversidade estarei com ele; vou livrá-lo e cobri-lo de honra. Vida longa eu lhe darei, e lhe mostrarei a minha salvação. "

Pra cima deles!

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Burra é a Administração.


Dois colegas antigões se estranhando no restaurante e eu, quietinha...

- Cara, come direito, você parece um otário. Vê se isso é jeito de se portar num restaurante desses?
- Ah, eu que sou otário? Tu é formado em quê, mesmo, ô babaca?
- Sou engenheiro civil, otário, e você, que não tem um pingo de educação, deve ser analfabeto de pai e mãe, né?
- Engraçado, tu é engenheiro e eu só tirei o segundo grau. Mas ganho o mesmo salário que você. Quem é o otário aqui?

terça-feira, 16 de novembro de 2010

Culpa.

De arrepiar a alegria dele pela chegada da mãe após alguns dias fora, caçando com os homens da aldeia. A mãezinha guerreira ganhou beijo molhado, abraço gostoso e três bilhetinhos que diziam: "Mamãe eu te amo"; "Mamãe, você é muito linda" e "Mamãe, senti falta de você". Tinha tudo pra se sentir a última bolachinha do pacote, afinal ela era uma caçadora, uma guerreira e era a mãe do indiozinho mais alegre, mais lindo e mais carinhoso da tribo. Mas tinha aquela dor. A lembrança do dia em que a professora dele a chamou pra bater um papinho causticante. E enquanto o indiozinho brincava no pátio ela ficou sabendo que ele  demonstra que adora os pais, mas parece ver a mãe como uma pessoa inacessível. Essa última palavrinha ácida lhe acertou o peito como flecha profundamente lançada, do tipo que entra e não quer mais soltar e que dói ao toque mais tênue. "Deve ser de família" concluiu a mãezinha absorta e cheia de tristeza "pois o pai dele pensa a mesma coisa de mim".

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Queridos leitores,

Nossa amiga Priscila Castro publicou em seu blog a  entrevista que vocês pediram. Só tem um pequeno detalhe, depois de alguma negociação (de dar inveja à máfia siciliana), concordamos em retirar as perguntas e só ficaram as respostas mix-turadas. Pra você que votou na enquete da Pri, os meus comovidos agradecimentos e 130 (!!!) beijos no coração. Aguardo vocês lá:

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Velozes e furiosas.


Uma equipe de motociclistas de outra polícia participou conosco da missão e nos deram a maior força  no trânsito. Cada moto linda recuperando nervosamente pela esquerda, outras mais ousadas ainda recuperando pela direita! Gestos imponentes, elegantes. Movimentos precisos, coordenados. Manobras intrépidas, corajosas. Arrancadas velozes e furiosas! A cidade parou para o comboio passar tranquilo e majestoso por ruas e avenidas. Era rock'n'roll total lá fora, mas no silêncio do interior do carro eu quase podia ouvir o "Concerto para Piano nº 21" de Mozart, enquanto observava as pessoas com a boca entreaberta de curiosidade na rua. Quando chegamos ao ponto final da missão voltamos lá fora para agradecer o necessário e tão útil apoio recebido. Já estavam de partida, mas cerimonialmente estacionaram, desceram das motos e então tiraram seus capacetes... Rá! Sabe propaganda de shampoo? Pensa só: uma equipe todinha de mulheres policiais batedoras!!! Gente, que coisa mais linda! Sufoquei bravamente os gritos histéricos de tietagem explícita, porque né, sou adulta. Mas também não me peçam o impossível! Não dava pra perder uma foto com uma equipe dessas! E na maior cara de pau eu perguntei. Perguntei, mesmo, porque eu realmente precisava saber onde foi que elas compraram aquelas botas de pa-rar o trânsito.

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Passado inglório.

"Ah eu não sei se eram os antigos que diziam,
 em seus papiros, Papillon já me dizia
que nas torturas toda carne se trai e
normalmente,
comumente,
fatalmente,
felizmente,
displicentemente o
nervo se contrai
com precisão"

(Zé Ramalho)
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Ps.: Santa barba virgem!!!
Acabei de ver o "Mulher na Polícia" numa enquete lá no Blog da Pri!
Não é um post, a pesquisa está na barra lateral.
Sacanagem, Pri! Eu vou levar uma surra!



quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Tiro no pé.



Ele sempre teve ciúmes dos meus amigos, mesmo fora da polícia, porém ciúmes eu também tenho e acho que um pouquinho só não mata ninguém. Me acompanhou, meio a contragosto, a uma festinha da polícia e fiz questão de apresentar-lhe todos os meus colegas. Apostei que seria legal enturmá-lo com o pessoal. Mas não. Errei o tiro porque ele se sentiu totalmente deslocado, talvez impressionado ou inseguro. Pra quem não é do meio, deve ser mesmo um saco esse papinho de polícia, cheio de frases de laboratório... Ficou emburradinho a noite toda. Bruto, como se nunca mais quisesse ser meu. E eu triste sem poder fazer nada, porque ele sofre calado sem dar o braço a torcer. Senti uma mágoa na voz dele quando me disse que não tem dúvidas da atração físico-químico-linguístico-antropológica que tenho por ele, mas questiona filosoficamente o amor que sinto. Bandido! E, pra piorar, as circunstâncias não colaboram nem um pouco. Outro dia me perguntou por que a secretária do delegado ligou aqui em casa se eu estava trabalhando. Alerta! Como é que eu vou saber?! “Porque eu não ouvi o celular tocar” respondi. Que ódio daquela desunida bigoduda! Cara, isso queima o filme da gente, né? Mas o golden point da semana foi outro colega que ligou para o meu celular no sábado de manhã. Ele atende e o cara desliga! (E o quê? Susto?). Ele então  ri com desprezo: Óbvio que ele conhece o número da delegacia... Caramba! Será que esse pessoal não se dá conta de como é difícil arrumar um homem decente na atualidade?

Ps. Essa policial aí na imagem é a Beyoncé, no clip "If I were a boy". Mais conhecido por estas bandas como "If I were a cop". Cuidado: contém fortes ceninhas de ciúmes.

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Outra novinha em adaptação.

(Por e-mail)
Oi "Novinha"! Que bom que me ligou. O plantão me deu o recado mas não me passou o número do telefone pra eu te ligar de volta! Adorei receber notícias tuas! Como estão as coisas? Ainda estás no mesmo lugar, com o "007"? Estou louca pra saber as novidades sobre tua casa, tua família, o trabalho. Como estão os estudos de línguas? Eu resolvi vir para o plantão, primeiro no "setor Sierra” e agora no “Alfa”, pra tentar estudar. Não é bem meu trabalho preferido mas não dá pra reclamar. Quando passar o verão, que é bem movimentado, vai ser um paraíso pra estudar. Quando vens "à minha cidade"? Precisas vir ver minha casa nova. Tá ficando bem legal. Já passei da fase de construção, tô me batendo agora é com os móveis. Devagar e sempre. Beijos. Da tua amiga "de longe".

Ps.1: O que está entre aspas foi adaptado.
Ps.2: Tem selinho aqui pra você.

terça-feira, 12 de outubro de 2010

Touché!

Interessante como algumas coisas na vida de uma mulher podem até parecer simples mas se eternizam pelos efeitos: duas gotinhas de um certo perfume, aquela cinematográfica cruzada de pernas e uma legítima carteirada policial bem dada. Em qualquer uma dessas situações prepare-se para ver um predador se transformar em presa.

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Caríssimos leitores,

É com grata satisfação que comunico a vocês que uma jornalista de Brasília, a gatíssima Alane Moraes, conseguiu arrancar de mim o que outros jornalistas não conseguiram. Ela acaba de publicar um texto meu em seu blog "Manual das Mulheres Modernas". E antes que vocês se assustem explico que o assunto lá foi provocação dela mesma. Beijo, Brasil!

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

O 007 só fala 001 idioma.

Estou começando a entender o funcionamento da coisa por estas bandas. Perguntaram se eu falava inglês e eu respondi "Yes, I do". Então tinha que ser eu mesma. Ótimo! Todavia, quando chegamos ao local da missão, a necessidade era de alguém que falasse inglês, francês e espanhol! E eu fui, devagarzinho, me soltando e marcando meus pontinhos com a equipe: Yes, yes, yes! Oui, oui, oui! ¡Si, si, si! Placar final: três a zero pra novinha aqui. Bom, falaaar mesmo que é bom eu não falo quase nada desses idiomas, mas foi o meu enrolation aliado ao portuñol e um biquinho forçado que tirou a equipe toda do sufoco. E se eu fosse babaca aproveitaria a oportunidade pra mandar um recado para o meu chefe, que adora dizer que os novinhos de hoje têm muita teoria na cabeça, mas perfil policial que é bom, nada: "Perdeu, chefe! Perdeu uma ótima oportunidade de ficar calado".

sábado, 25 de setembro de 2010

Ela dança com lobos.

Eu bem que poderia tirar a maior onda com este certificado bonitinho. Posar de "policial operacional especializada". Mas, francamente, que cursinho mais besta! Eles têm uma mania de colocar tanta pompa e cerimônia no nome do curso que beira o cinismo. Pois fico achando que até um chipanzé domesticado concluiria este treinamento com louvor. É mais um mito que despenca numa dose extra de realismo. Tô andando pra esses cursos e só não vou considerar uma perda total de tempo porque pude fazer bons contatos e conhecer pessoas interessantes. Esta agente, por exemplo, tão ironicamente aluna quanto eu. Com a pequena diferença de que eu sou anônima né, e ela é uma lenda viva que jamais passaria despercebida, primeiro por seu exótico visual neo-hippie, segundo pelo fato de que todo mundo ali já tinha ouvido falar dela.

Eu acredito que ela já tenha tempo para se aposentar, mas quem a vê operando não diz isso. E isso é bonito demais. Ela tem enormes tranças loiras no estilo rastafari a contrastar com a pele marcadamente bronzeada que lhe dão um ar de medusa, de cigana, de mistério, de disfarce. O que dizem é que ela sabe se portar muito bem no teatro operacional, enxerga tudo como uma águia e tem verdadeiro feeling pra coisa. Não fica atrás de homem nenhum nas operações que participa, nem na hora de levar tiro! Logo se vê que ela tem um caso com o perigo de viver e definitivamente se entrega à paixão. "Ela tem sangue no olho", gente (bom, seja lá o que isso quer significar, pelo contexto me pareceu muito irado). E sofro de pensar que ela consegue fazer tudo isso sem estragar aquele esmalte nas unhas luxuosamente vermelhas. E tem mais... Me contaram que aquele capricho todo nas delicadas trancinhas dela é obra de um preso... cabeleireiro... que está na custódia da delegacia dela! Vai ver essa mulher hipnotiza cobras também...

Quanto tive coragem de puxar conversa, ela não fez aquela pose blasé característica de quem se acha. Não. Continuou sentada no meio-fio, como se já me esperasse e disse "Claro que sim, tem alguma coisa específica que você queira saber?" Tem. Eu queria saber até o que ela come no café da manhã! Acho que ela sacou que eu me perdia em tanta dualidade e que eu procurava não ser a chata das perguntas sem-noção. E com a delicadeza de quem sentia ternura por minhas dúvidas ou talvez por meu coração batendo apertado de deslumbramento, não quis reforçar nem anular a mística que rola em torno dela. Ela é dessas que não precisam se afirmar. Tínhamos que encerrar a conversa, pois os veículos da aula já tinham chegado, então ela me disse sutilmente pra relaxar, e acrescentou que tudo acontece naturalmente na vida da gente. Não é de arrepiar? Só falta alguém dizer que ela também lê o futuro das pessoas.

domingo, 19 de setembro de 2010

Confissões de uma concurseira.

Já pedi desculpas a ele várias vezes por adormecer de cansaço antes da hora; Já varei noite estudando para concurso; Já dormi muito em mesa de biblioteca; Já tomei muito café pra acordar; Já passei frio no ar-condicionado do curso; Já passei fome em sala de estudos; Já fui dormir às duas da manhã porque acabei tomando pó de guaraná demais para ficar acordada durante a aula; Já senti dores de coluna por causa das longas horas sentada pra estudar; Já assisti aula gripada; Já pedi a Deus para chegar logo o intervalo a fim de comprar remédio pra cólicas menstruais; Já fiz prova com dor de cabeça; Já tive dúvidas se valeria a pena; Já tive certeza que não valeria a pena; Já ouvi conselhos para estudar menos; Já ouvi conselhos para estudar mais e já estudei errado demais.
Já fiz versão de música do U2 para decorar os crimes hediondos; Já ouvi CD para decorar a Constituição; Já viajei para fazer prova; Já viajei na maionese; Já falei sozinha estudando; Já fiz passos de dança estudando; Já “mandei” colega calar a boca pra poder ouvir o professor; Já quis matar o vizinho que liga o som na maior altura; Já pensei em me mudar para o Alasca a fim de ter um pouco de paz para estudar; Já cantei "Breakaway" da Kelly Clarkson, com a mão no peito, como se fosse o "Hino Oficial dos Concursandos".

Já fiquei por muito pouco; Já perdi no psicotécnico; Já tomei pau em entrevista (que ódio!); Já fui reprovada em prova de digitação; Já "boiei" a aula inteira sem entender por.caria nenhuma; Já dei muito tapa na testa sem acreditar que consegui errar aquela questão; Já ouvi muito "boa-sorte" antes da prova; Já gastei horrores com cursinho; Já jurei nunca mais fazer cursinho; Já botei banca de quem vai arrasar na prova e saí da prova arrasada; Já fiz prova de natação com maiô emprestado; Já chutei em muitas questões; Já errei questão que até hoje não entendi por quê; Já fiz pergunta idiota; Já me assumi como burra e idiota; Já considerei o professor um burro e idiota e já achei que o mundo inteiro era burro e idiota.

Já levei patada de professor de cursinho; Já levei cantada de professor de cursinho; Já fiquei com professor de cursinho; Já fiz muito resumo de livro; Já comprei livro caro que nem usei; Já li muito sobre como passar em concursos públicos; Já assisti palestras sobre memorização, motivação, embromação; Já li "A Arte da Guerra"; Já pintei muitos trechos de livros de amarelo (importante!), cor-de-rosa (jurisprudência!), azul (novidade!), verde (caiu em concurso!), laranja (caiu na prova da polícia!!!); Já dei muito murro em ponta de faca; Já chutei o pau da barraca e já fiquei meses sem ânimo nem coragem de pegar num livro!

Já fiquei sozinha em casa para estudar com a família viajando e já-ouvi-sermão-por-causa-disso... Já me pediram pra mudar de assunto porque eu só falava em concurso; Já fui chamada de antisocial, de maluca, de egoísta e inconsequente; Já disseram que eu ficaria louca de tanto estudar; Já disseram que eu iria morrer de tanto estudar; Já vi muita gente boa desistindo pelo caminho; Já esperei edital demais e quase morri mesmo, quando o bendito edital finalmente saiu.

Já cruzei a linha de chegada, já recebi os parabéns por ter conseguido passar nessa droga dessa prova filhadamãe! Já recebi o contracheque, a carteira, o distintivo e a "Isabella" (a belíssima, elegante e estonteante pistola que anda comigo) mas o melhor de tudo é que nunca vi minha mãe tão linda e tão feliz, chorando de orgulho na minha formatura na Academia (ô, mãe...).

Portanto, dá pra perceber que não sou ninguém para dar conselhos. Só sei que não existe “receitinha fácil” para passar em concurso público. Não tem isso de sorte ou azar. Existe determinação, abnegação e fé. Mas o mais importante é ter fé, porque né, se mesmo aos trancos e barrancos, com tantos erros, trapalhadas e fracassos, Deus ainda resolveu atender generosamente às minhas orações, por que ele não atenderia às suas também?

sábado, 11 de setembro de 2010

sábado, 4 de setembro de 2010

Mulher e ponto.


O primeiro homem que me chamou de "novinha" não era policial. Era o tipo "partidão absoluto", daqueles que roubam a cena e monopolizam as atenções em qualquer reunião social. Ele tinha 25 anos e uma família ultra tradicional vivendo no interior do meu Estado. E eu tinha 15 aninhos e uma certeza juvenil de que aquele era "o homem da minha vida". E a gente conversava, trocava umas cantadas imperfeitas, elogios insinuantes entre sorrisos intensos e olhares indefinidos. Era uma linguagem pura e bonita de sedução. E só ficava nisso.

Até que numa bela noite de lua cheia e cheiro de árvores ele veio com um olhar animal e aquela pegada firme de quem avisa: "Eu vou te engolir inteira!" e eu, com experiência "zero km", me assustei e dei o passo para trás mais tímido de toda a minha existência como quem pede "Hold on, cowboy". E isso foi tudo. Foi o mais perto dele que consegui chegar. Graças a Deus, porque dias depois, ao tentar engatar novamente a primeira marcha, tomei um fora tão intempestivo e tão dolorosamente descomunal que até hoje trago a cicatriz. O motivo? Eu era "muito novinha" pra ele... Tudo bem que perdi o chão, o rumo de casa e fui parar no inferno, mas hoje, sei que o trauma poderia ter sido bem pior.

Atualmente são necessárias algumas horas de carro na estrada para chegar à minha cidade. É lá que vivem meus familiares, meus grandes amigos e o meu passado. Soube que "o partidão" se separou da mulher. E ele também já sabe que o meu coração agora tem dono. Então, ninguém se esbarra a não ser quando a vida resolve aprontar das suas. Num desses feriados prolongados na minha cidade, eu contava empolgadíssima as minhas "aventuras policiais", feito gente grande, numa roda de amigos onde, em meio a muita risada, choviam essas perguntas curiosas e ninguém piscava pra não perder o fio da meada... Era eu me sentindo de alguma forma interessante. E eis que o meu passado resolve aparecer no meio da noite pra me assombrar. A chegada do "partidão" era a deixa para que eu concluísse a minha historinha e evaporasse dali resignada e obediente, como manda a etiqueta do mais fraco... Mas dessa vez foi diferente. O presente me era tão mais pulsante e atraente! Eu estava tão bem, tão feliz e com tantos amigos querendo saber tudo sobre como era na polícia, e como é que eu fazia e não sei mais quê... que minha respiração foi se acalmando e eu fui ficando! O "partidão" entrou... veio me cumprimentar de um jeito que não era o seu, mas que me pareceu adequado, e até participou daquela sabatina de amigos! Cara! Vocês precisavam ver o jeito disfarçadamente espantado e surpreso como ele me olhava... Foi naquela noite que vi nos olhos dele como aquela guriazinha tímida de 15 aninhos cresceu e se tornou uma mulher. Até sonhei que estava cantando "Baba, baby, baba" pra muita gente esnobe na polícia que ainda me chama de "Novinha".

sábado, 28 de agosto de 2010

Afogando as mágoas.

Eu o.d.e.i.o (profunda ênfase nessa palavra, por favor) quando eles saem para alguma operação e me deixam aqui de molho! Vontade infinita de crescer, fazer e aconte-SER, mas aonde?! Primeiro: como é que vou adquirir experiência cercada de paternalismo por todos os lados? Segundo: quando é que esses caras vão passar a me levar a sério? E terceiro, mas não menos importante, este blog tá virando emo?!

sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Pais e filhos.

Meus dois neurônios não sabem mais o que dizer. Enquanto um lamenta a morte de mais um colega e se desespera o outro procura consolo e canta trechos fora de ordem de uma música triste:

Estátuas e cofres
E paredes pintadas
Ninguém sabe
O que aconteceu...


A Academia é o útero orgulhoso e exigente que gera os policiais "novinhos" e aborta sem dó os considerados inaptos.

Meu filho vai ter
Nome de santo
Quero o nome mais bonito...

Com o brado de "NUNCA SERÃO!" ela embala os sonhos de quem quer vestir a camiseta de polícia mais linda desse mundo.

Dorme agora
É só o vento
Lá fora...

Pra ter a prerrogativa de portar este distintivo, você passa por um milhão de provas, sob um austero controle de qualidade. É urgente estar inteiro física, moral, intelectual e psicologicamente. E ai de quem não estiver bem preparado, pois durante o curso a Academia falta lhe pedir o coração numa bandeja, independentemente de sexo, idade, experiência, crença, convicção filosófica, condição financeira, partido político, estado civil, ou de sua capacidade de fazer beicinho.

Me diz, por que que o céu é azul?
Explica a grande fúria do mundo...

"Não sabe a resposta?!? Paga cinquenta flexões de braço! Não há desculpas... Não gostou??? Pede pra sair!!!". E você dá o sangue rindo, orgulhoso de fazer parte dos poucos que sobreviveram à saga do concurso policial e se joga!

Ela se jogou da janela
Do quinto andar
Nada é fácil de entender...

E ao bater no chão você percebe que era pura pirotecnia, porque depois que você finalmente toma posse, ainda com os joelhos ralados, encontra um número impressionante de policiais largados, abandonados, machucados, estuprados, decepcionados, alcoólatras, obesos, anabolizados, adulterados (Eu moro com a minha mãe mas meu pai vem me visitar), deprimidos, infartados, estressados, workaholics, solitários, insones, fracassados como pais (São meus filhos que tomam conta de mim...), suicidas em potencial, cheios de desculpas e o pior de tudo, armados!


Quero colo!
Vou fugir de casa!
Posso dormir aqui com vocês?
Estou com medo, tive um pesadelo.
Só vou voltar depois das três...

Somos a noiva linda, maravilhosa e apaixonada que se prepara toda para o sonho do casamento e se cuida tão somente até o final da lua-de-mel, porque com o advento das decepções deixa-se destruir aos poucos igualzinho à mulher mal amada que toma raiva de si mesma e do mundo.


Isso me entristece um bocado não só por eles, mas porque estou ouvindo vozes dizendo "Eu sou você amanhã, Novinha". Será que você ainda não entendeu que eu não vou seguir seus passos? "Não me ensina a morrer que eu não quero"*.

Sou uma gota d'água
Sou um grão de areia
Você me diz que seus pais
Não entendem
Mas você não entende seus pais...
Você culpa seus pais por tudo
Isso é absurdo
São crianças como você
O que você vai ser
Quando você crescer?


Que desgraça, antigão! Perdemos mais um colega... Vem, senta aqui perto de mim e me convença de que não foi ele mesmo que se matou.
É preciso amar as pessoas
Como se não houvesse amanhã
Por que se você parar
Pra pensar
Na verdade não há...
(Legião Urbana)
*Marisa Monte em "Perdão, você"

domingo, 1 de agosto de 2010

Não me provoca.

E se eu te disser que conheço esse olhar, que percebo logo sua alegria tonta de meia satisfação disfarçada quando me vê chegar? Às vezes, não preciso olhar para ver que você está me olhando. E eu quero tanto esconder minhas vulnerabilidades e agravantes. Mas você quer deitar e rolar em cima disso. E se eu te disser que quem está vulnerável é você, guerreiro? Te flagrei desviando um olhar tímido e teimoso, como se relutante em me perder de vista. Você estava procurando o que no fundo dos meus olhos? Você não sabe. Não sabe que está completamente desarmado. É tanta força pulsando violentamente nas tuas veias endurecidas e me espanto em ver teu coração tão exposto, sonhando fantasias ao sereno. Você, claro, vai querer jogar a culpa em mim. Vai dizer que foi aquele dia em que pedi sua ajuda para imobilizar com um esparadrapo um dedo da minha mão que doía ao movimentar-se. Eu vi com olhos de mulher a tua boca trêmula tão logo recuei com uma expressão de dor. Você pediu desculpas por ter pressionado sem querer o local lesionado, mas a sua voz já tinha mudado. Era tarde demais. Era triste demais. Contato físico demais: regra número um! O ferido é você, parceiro. Você está delirando. Caiu ardente de febre pela minha dor, não foi? Se você quiser eu assumo a culpa... Pronto. Mea maxima culpa. Só não me provoca, te imploro como quem faz uma prece. Deixa doer... Não comece o que você não dá conta de terminar e me perdoe, mas não vou colocar poesia nenhuma neste texto.

quarta-feira, 21 de julho de 2010

Enquanto você rezava.

Eu: Mas por que ele?
Chefe: Porque ele é um dignitário do altíssimo clero, Novinha.
Eu: Mas por que eu?
Chefe: Porque você é mulher, fica uma segurança mais discreta.
Eu: Mas então o quê?
Chefe: "Então o quê" o quê, menina!?
Eu: Os anjos estão em greve?

sábado, 17 de julho de 2010

Efeito colateral.

Tinha alguém observando a diligência policial. Era uma menininha de uns 5 anos, creio. Ela me estende uma folha de caderno dizendo que é um presente. Era o desenho de uma mulher segurando uma arma enorme em uma das mãos. Horrível, mas era eu. E como odiei ser o que ela viu... Agradeci o presente e investiguei, na tentativa de minorar o estrago, "Ué... e essa arma enorme aqui, mocinha? Eu não estou segurando arma nenhuma..." falei deslizando os dedos pelos cabelos de boneca dela. "É, mas você tem uma 'iscudida', não tem?" Na verdade eu portava duas armas individuais, uma na cintura e outra na canela, sem contar as de uso coletivo que não estavam comigo naquele momento. Melhor mudar de assunto. "Você é muito linda e muito espertinha sabia?" Ela sorriu e eu insisti "Mas eu também não estou usando esses saltos altos chiquérrimos como você desenhou. Olha aqui a minha botinha". Eu me apegava a detalhes querendo convencê-la (ou me convencer) de que havia algum engano e que aquele desenho não podia ser eu. Então ela explicou direitinho que aquilo realmente era salto de modelo, que eu sou modelo para ela que seria, então, a minha estilista. Assim entendi que "monstra" não era eu no desenho mas essa baita responsabilidade.

segunda-feira, 12 de julho de 2010

Na cela dessas dores.




"Amar é um deserto e seus temores

Vida que vai na cela dessas dores

Não sabe voltar

Me dá teu calor"

(Djavan)


Dormi com o roupão que você me deu no dia dos namorados. E só. Ele é tão macio e tão gostoso, amor, mas não aquece o meu peito como você prometeu que ele faria em caso de você não estar por perto. A saudade está me machucando mais do que deveria. Procurei seu tornozelo pra encaixar o meu pé a noite inteira. Não veio o seu corpo me cobrir. Não senti a sua respiração pesada, perfeita, a me tirar o fôlego. Sinto falta do seu cheiro, do seu gosto e do jeito como você me desperta. Não foi você que me acordou hoje cedo, amor, foi a tristeza. Ela veio me perguntar, às cinco e meia da manhã, se eu tinha certeza que você me amava. Não dormi mais. Covardia, porque se eu estivesse aí ela não teria vindo. Levantei, tomei um banho pra limpar a mente, urgente mente, mas era só água brincando gostoso no meu corpo e dúvidas não saem no banho. Queria saber se a terra congelou ou se é só mesmo a sua ausência. Choveu cinzas ou é medo esse tom gris na paisagem? Você pode mandar um beijo quente pra mim, amor? Basta isso e devolvo quando voltar, com juros e tudo mais a que você tiver direito. São custos que as diárias das viagens a serviço não cobrem.

quarta-feira, 7 de julho de 2010

Me chama de lagartixa.

Não escondo quando sou fã de alguém. Tem um colega aqui na delegacia que exerce um fascínio sobre mim e sabe disso. E eu peço: "me ensina", "me ajuda", "me faz ser como você", mas ele não me dá a mínima atenção. Por um milhão de vezes saiu andando e me deixou falando sozinha. Ele me deixa sem respostas. Me deixa querendo. Dizem que é o jeito dele e ele pode ser o que ele quiser, porque ele é um agente bem mais experiente. Ele é um líder. Ele sabe. Ele simplesmente é. Já dei todas as dicas desse mundo, diretas e indiretas pra ele me levar pra trabalhar com ele naquela seção. Diz que me quer, mas não age. Acha que tenho potencial, mas me falta a bendita experiência. Certa vez, comentou com um outro agente nestes termos "Quando tiver uns dez anos de casa ela será uma ótima policial". Dez anos... é tudo o que ele tem a dizer a meu respeito. Então eu me alimento das migalhas que caem da mesa dele, como uma lagarta que não vê a hora de se transformar em borboleta.

Um dia, me chamou pra acompanhá-lo em uma visita muito importante. Entenda que se ele faz é porque é importante, senão ele mandava outro e ele manda muito bem. Chegamos ao gabinete de um político muito bem relacionado, mas terrivelmente encrencado. Nos identificamos formalmente e todas as portas se abriram, porque o figurão precisava da gente. Arrego! Como o mundo muda quando a polícia é necessária! Sentamos os três pra discutir um problema. Sabe quando você só pensa em não cometer nenhuma gafe e não atrapalhar nada? Não demorou pra eu chegar à conclusão de que era melhor ficar caladinha, pequenininha, conformadinha. Enquanto colocava a situação, o político deixava bem claro que a palavra "polícia", pra ele era sinônimo de "capacho para meus caprichos" dizendo: "Façam assim e assado, não quero que seja deste nem daquele jeito..." Até que encerrou o discurso com uma pergunta: "Estão entendendo bem?" Congela. E antes que eu me levantasse e fizesse uma continência gritando "Sim senhor!!!" (de onde tirei essa continência?!), meu colega, que ouvia tudo com cara de paisagem, fez uso da palavra. O que ele disse, num resumo prejudicado pela minha parca capacidade de síntese, foi isso: "Faremos o trabalho que nos compete do nosso jeito, ou seja, do jeito da polícia e não do seu jeito, excelência".
Todavia, meu colega era tão seguro, tão adequado, tão bem preparado, tão profissional, tão convincente, tão senhor da situação, tão incisivo, tão capacitado, tão eloquente, tão educado, tão nobre, tão articulado, tão necessário, tão MBA, tão forte, tão príncipe, tão perfeito, tão bonito, tão Jack Bauer que o político foi mudando o tom de voz e passou a nos perguntar como ele deveria proceder pra colaborar. Cruzei os braços, corrigi a postura para o modo "a-polícia-é-f.era" e assisti de camarote a dinâmica da conversa mudando ali na minha frente. Agora o figurão pedia a nossa autorização para fazer alguma coisa que nem nos cabia autorizar... e quase pede desculpas por ser um... político! Era um verdadeiro espetáááááculo de arena e meu colega Jack Bauer levantou-se viril, abotoou o terno Jack Bauer dele e saiu de cena com a mesma elegância Jack Bauer com que entrou, como se ser Jack Bauer pra ele fosse fácil, uma coisa banal. A fotografia que faço de meus 1,78 m de altura (O.k , eu tava de salto... Tá bom, um salto enorme!) ao lado desse colega gigante ao despedirmo-nos é a de uma grande promessa. Ele vai ter que me ensinar, ah vai.

terça-feira, 29 de junho de 2010

Teatro dos Vampiros.



Cena 1 - O sangue nosso de cada dia
(Abrem-se as cortinas). Comento com alguém de fora da polícia o fato de em determinado Estado morrer quase um policial por dia. E ele me responde, assim, numa boa, sem querer me ofender:
- Morre, sabe por quê?
- Por quê? Perguntei (Burra!).
- Porque ninguém aguenta mais pagar um "cafezinho" pra eles todo dia. (Ele sai de cena)
Cena 2 - O hálito do diabo
(Pouca luz. Monólogo) - Claro que sei que ele existe, mas sempre soube dele como um ser asqueroso, insultuoso. O corruptor é aquele que tenta te corromper, subornar, comprar. Santa ingenuidade, porque ele foi extremamente sutil. Encostou em mim, com tanta leveza, como quem não quer nada. Senti um perfume intensamente atrativo e envolvente no começo da conversa, mas depois a náusea me veio à garganta. Insídia, coisa podre no ar. Ele se apresenta com vários nomes falsos. Disse a mim que se chamava "Opportunity", porque em Inglês soa ainda melhor. E eu merecia uma oportunidade! Sua lógica mostrou-se tão verdade. Por que pareci tão fácil assim aos olhos dele? Que imagem esquisita é essa que se diz minha e me trai? Ele quase me ganhou. Chegou a tocar no meu rosto e aproveitou-se disso para passar a mão na minha cabeça! Abusado. Conseguiu me fazer sentir tanta pena de mim mesma. (Sobe a música*). "Sempre precisei de um pouco de atenção, acho que não sei quem sou só sei do que não gosto. E nesses dias tão estranhos fica a poeira se escondendo pelos cantos. Esse é o nosso mundo. O que é demais nunca é o bastante e a primeira vez é sempre a última chance..." Com todo respeito aos seus cabelos brancos: Vai pro inferno, mentiroso! (Mas que porca miséria! Perdi um flagrante! )

Cena 3 - O exorcista
Depois de expor em seu blog uma grande decepção com a descoberta de um colega corrupto, o Sargento Lago da PMESP conclui: "A Bíblia, livro sagrado dos cristãos, diz que: 'o diabo veio para matar, roubar e destruir'. Compete à polícia o papel de impedi-lo". (Fechem as cortinas!)
*Letra da música Teatro dos Vampiros - Legião Urbana.

quinta-feira, 24 de junho de 2010

Batom calibre 12.





Coloquei vários cartuchos reservas nos bolsos da calça e ignorei o fato de já ter guardado um batom num deles. Porque sabe, eu preciso do meu batom e ainda não existe porta-batom operacional. E quase alimentei uma espingarda 12 advinha com quê? Perguntemo-nos: "Como foi que essa mulher passou no psicotécnico?" Respondo: Sei lá... Talvez o psicotécnico seja mais direcionado a eliminar quem apresente tendência para fazer o contrário, algo como disparar um cartucho de 12 na boca pra retocar a maquiagem, entendeu? Já disse que adoro atirar em treinamento, mas essas armas não combinam com nada que eu uso. É o fim. Portanto, posso te garantir que, embora elas me contem sobre seu poder de sedução, pra mim, portá-las não é nenhum requinte de vaidade.
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Caros leitores, não sabia o que fazer com os selinhos que eu ganhava e acabei guardando tudo na página "Tentativas de suborno" que fica no rodapé da barra de links aqui à direita. Portanto:
  • considerando a incrível marca de 30 postagens num blog de uma mulher policial anônima. O que é uma coisa que tem absolutamente tudo pra dar errado...
  • considerando a chegada de mais de 171 seguidores na categoria "Informantes".
  • e considerando que "uma mão molha a outra"... Calma gente, falaremos sobre corrupção na próxima postagem. rs rs rs É só uma maneira bem humorada de prepará-los para esse assunto tenebroso. Podem pegar os selinhos à vontade, porque juro que não é pegadinha e garanto que não haverá represálias.
Verifique, por favor, se você não é um dos contemplados!!!

terça-feira, 15 de junho de 2010

Garoto nervoso.


Sabe o fim do mundo? Então, lá tem uma escola. Sabe quando tipo ninguém quer cumprir alguma missão? Mandam algum novinho, né? Eu, no caso. "Mas eu vou so-zi-nha?" Resposta: "Você fala super bem em público, não vai ter dificuldades". É, eu falo super bem em público e não vou ter dificuldades. Foi assim que me convenceram a proferir uma palestra sobre drogas numa escola pública de periferia. E eis que, quando tudo ia muito bem, obrigada, um aluno do sexto ano levanta a mão e me nocauteia com essa pergunta espetacular: "Mas, tia por que a polícia bate na pessoa que usa drogas?" Conclusão: droga é isso, gente - um moleque de onze anos que sabe mais da vida do que eu.
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Queridos leitores: O jeitinho que encontrei pra sair dessa saia justa está na resposta dada ao comentário da minha querida amiga Bia (95º deste post). Um beijinho e muito obrigada a todos por terem vindo!

terça-feira, 8 de junho de 2010

Sr. e Sra. Má Reputação

Às 10 horas em ponto eu chegava toda produzida ao local indicado, conforme combinamos. Um hotel vinte estrelas nesta cidade. Pensei em telefonar, mas ele já estava fazendo o check in na recepção. De relevante, notei sim, a aliança que brilhava na mão esquerda desse colega policial assinando a ficha, mas não percebi mais ninguém conhecido na cena. Ótimo! Fico imaginando onde aprendi a correr esses riscos que parecem saltar na minha frente. Deixa. Tomamos o elevador. Como ele tava lindo! Que transformação! O surfista penteado e barbeado. Aquele cheiro macio e cremoso pós-barba. E mesmo sem olhar eu sabia onde estavam os olhos dele, por óbvio. Um silêncio que dava pra ouvir a respiração do outro e ele masca um chiclete de menta. Eu só encarava o chão, castamente, e contraía os músculos mandibulares de forma quase involuntária: queria um chiclete... e outra metáfora. Penúltimo andar. A porta do elevador se abriu. Corredor vazio de doer. Ele convidou, "vamos?". E agora? Acabou me convencendo de que ele sabia o que estava fazendo e permiti que ele me conduzisse por caminhos diferentes. Rotas de fuga. Não vou entrar em detalhes, mas posso garantir que aproveitamos bem o tempo para fazermos tudo o que aquela urgência exigia de nós... na piscina, na cobertura, nos restaurantes vazios, na sala de ginástica, na garagem, nas escadas de emergência, nos elevadores, etc. Não é exagero. Não podia imaginar que havia tantos detalhes interessantes num hotel! Saímos de lá juntos, três dias depois, exaustos devido às noites mal dormidas... E assim temos mais uma segurança de dignitários para o meu currículo. Dessa vez fiquei na equipe fixa do hotel. Trabalho, sim, vocês estavam pensando o quê? É assim mesmo que funciona: Uma very important person de fora, que tenha direito à nossa segurança, chega à uma cidade e é escoltada pela equipe móvel. Segue para um hotel bem legal. Claro que antes dela chegar uma equipe já fez todo o plano de segurança e levantamentos de inteligência, outra equipe já fez a varredura eletrônica (contra espionagem, escutas, captação de imagens) e anti-bombas na suíte VIP e adjacências. É sério! Daí a equipe de segurança fixa passa a se responsabilizar pela segurança do dignitário naquele hotel e a gente vai se revezando na porta da suíte VIP enquanto ele estiver na cidade. No meu turno, eu sou a responsável pela vida, pela segurança física e até moral da autoridade que descansa. É importante estar preparada para qualquer situação. Me senti tão profissional! E quase pude ouvir meu pai a dizer: "Filha, pode ser ótimo como experiência, mas péssimo pra reputação". Vida irônica.

quarta-feira, 2 de junho de 2010

Um super, máster elogio.

Um caminhão-pipa à frente vazando água na rua seguido de um carro de passeio pequeno. Tudo parando por causa do quebra-molas. Norah Jones de carona no som... Um dia tão lindo... Nada a ver com esse óleo na pista e carro patinando! Ai, meu Deus! Os olhinhos dele acompanhando tudo... Vai bater!! E záz!!! Sem controle o carro desliza pra esquerda. Nosso Pai!!! E antes que colidisse com um veículo em sentido contrário, o carro encontrou pista seca e respondeu ao volante. Volta pra via da direita, transpondo a lombada devagar. Está tudo bem... Graças ao bom Deus! Foi quando ouviu o filhote dizer, espantado e cheio de orgulho: "Mamãe, ainda bem que você é policial, né?".
  • Mandar o carro para a oficina - R$ 5.000,00
  • Cirurgia plástica para consertar o corte na testa - R$ 4.000,00
  • Psicólogo infantil para terapia pós-traumática - R$ 3.000,00
  • Um elogio desses vindo do filho de uma policial - Não-tem-pre-ço e nem vai constar nos assentamentos funcionais.

quinta-feira, 27 de maio de 2010

Pede pra sair.

Melhor ter sofrido um trote daqueles que demonstram logo o "tipo sanguineo" do "sangue novo" que chega na polícia, a ter que aguentar essa mulher. Mais velha e mais antiga na casa que eu, ela implica dia e noite com meu sotaque, desaprova meu estilo street wear, recrimina minhas convicções políticas, faz piada da minha fé e torce contra o meu time de futebol. Adora me provocar, mas sempre levei em banho-maria e procuro manter distância segura. Finjo que nem é comigo. Em qualquer lugar do mundo isso seria bullying, mas aqui é normal que peguem no pé dos novinhos, ou de onde vocês pensam que veio a frase "Nunca serão!"? Dá vontade de pedir pra sair, mesmo. Só que o delegado percebeu, me chamou na sala dele e perguntou se eu queria que ele interferisse na situação. Imagina! Claro que eu disse que não. E o quê? Delegado se metendo em guerra de agentes? Porém, ele me fez perceber que a situação era mais grave do que eu imaginava e agora consigo entender algumas coisas estranhas que aconteceram. Mesmo assim insisti: "Muito obrigada, chefe, mas meus problemas resolvo eu. Já sou grandinha pra saber me cuidar". Mentira, porque né? Depois que saí da sala dele chorei igual criança sozinha. Agora eu sei... dores que a gente não entende são mais difíceis de tratar.

sábado, 22 de maio de 2010

Não faço a menor questão de ser fofa.

O delegado passa por mim apressado, me entrega um papel com nomes e respectivos números de telefone. Pede pra ligar e cancelar a reunião da tarde. Motivo: viagem. Tá... Pego o primeiro nome da lista: Daniel Inácio (fictício, né, meu povo...). Chama. Mal o telefone toca o sujeito atende.
- "Alô". (Voz de homem).
- "Oi, bom dia, o senhor Daniel Inácio, por favor".
- "Quem gostaria?" Ele perguntou. Só disse que era aqui da polícia e ele continuou. "Então você quer falar com o CORONEL Daniel Inácio"?
- "Por favor". Respondi, analisando o esmalte das unhas. E alguém quer saber a patente dele? Pensei.
- "Hummm, só um minuto, vou transferir pra ele". E a ligação caiu... Eu ligo de novo. Essas coisas acontecem. E ouço a voz do mesmo atendente.
- "Alô".
- "Oi, falei com você agora mesmo, pedi pra falar com o coronel Daniel Inácio e a ligação caiu". A cor e a textura desse esmalte são realmente fabulosas.
- "Ahhh, agora sim!!!" Comemorou ele. Tirei os olhos do esmalte e ele continuou: "Então você quer falar com o CORONEL Daniel Inácio??? Pois pode falar". Descruzei as pernas, me ajeitei na cadeira com os cotovelos na mesa, franzi a testa e conferi pra ver se estava entendendo direito. Onde é que fica o coronel na hierarquia militar? Não sei. Perguntei pausadamente:
- "Espera... então O SENHOR é o coronel Daniel Inácio?" Olhei de cantinho para o Parceiro que estava lendo alguma coisa. Ele já olhou pra mim rindo... Pisquei pra ele como quem diz "aguarde".
- "Sou eu mesmo. Agora você pode falar, minha filha". Gente, quase não acreditei!!! Será que esse corno pensa que é a rainha da Inglaterra? Pior! Esse sujeito tá se achando no direito de me enquadrar porque eu não o chamei de coronel??? Respirei fundo e a maldade já estava expressa no sorrisinho de um lado só da boca. Eu disse:
- "Ahhmm, não precisa mais não, viu? NÃO É NADA IMPORTANTE, CORONEL? NADA!" E pá! Bati a porcaria do telefone na cara dele, atendendo ao consagrado princípio da reciprocidade muito prestigiado no relacionamento entre as polícias.
Assim, um coronel veio marchando sozinho pra reunião que não teve, pra deixar de ser babaca. Palhaço!
Moral da história: Secretárias precisam dominar a arte de lidar com as vaidades; Agentes de polícia, não. Mulher na polícia é o quê?

sexta-feira, 14 de maio de 2010

Prerrogativas do cargo.

Ultimamente tenho tido pesadelos frequentes envolvendo morte em operações. Sonho que fui baleada, que estava desarmada, que a arma estava quebrada, que meu parceiro é bandido, que não consigo correr, que não consigo gritar, que não consigo. Então ele me abraça, me cura e me deixa dormir no melhor lugar do mundo.

quarta-feira, 5 de maio de 2010

Relatório de missão.

Só posso descrever meu estado como ebriedade profissional. Foi bom, intenso e muito gratificante participar da missãozinha chata, na qual ninguém acreditava, e que por isso mesmo caiu de bandeja no meu colo. E embora um delegado constasse como chefe da operação e houvesse discutido comigo cada ponto do plano, tinha que fazer outras coisas e acabei, por ironia do destino, assumindo o rock n' roll todo. Era eu tentando ensaiar meus passinhos tímidos na imensidão do universo policial. Todavia, o susto foi grande porque a operação evoluiu. Aumentaram o som, as cores e a moral da história. Pelo fato de ter acompanhado tudo desde o início era eu que tirava dúvidas dos colegas no brieffing (pasmem!). Por alguns instantes realmente senti toda a beleza de fazer parte de uma equipe de polícia, tal qual uma peça bem engrenada na força da máquina..., mas ainda é cedo. Segue. Me lasquei de tanto trabalhar e de tanta pressão porque se "tocasse o barata voa" (abafa!) eu não sei nem se saberia por onde começar. Oi, aquela fase de curso de formação acabou, baby. Não tem nenhum instrutor aqui pra tirar a gente do desespero e é terminantemente proibido errar! Não. Claro que meus erros não passaram em branco. Fizeram críticas quanto à "estética da coisa". Ok, não poderia passar sem críticas, mas logo sobre estética!? Se todo o resto estava bem então isso foi um tremendo elogio! Eu acho graça porque era uma missão impossível de dar certo. Mas deu e a causa era nobre! Graças a Deus pude dormir em paz. Hoje, meu coração acordou em ritmo de fé, pronto para novos horizontes, porém antes tenho que lavar essa camiseta suada que por vezes me deixa encharcada de orgulho.

terça-feira, 27 de abril de 2010

Jogo dos sete erros (agora com o gabarito).


Querido Brasil, depois de 45 celebrados comentários (Eu amo vocês!), largas gargalhadas e muitas surpresas que fariam Freud reescrever sua teoria da sexualidade vou passar o que eu consideraria um gabarito meu para o joguinho dos sete erros, referente à foto acima.

1 – Nem todo mundo que veste a camisa da polícia é um policial de verdade.
Esse bonitão fardado aí da foto não é da PMERJ é um modelo trabalhando para uma campanha da grife italiana Relish. Indícios nesse sentido são as enormes tatuagens do braço e a barba mal feita... Ok, isso também não define nem de longe um verdadeiro policial.

2 – Nem sempre quem está numa aparente situação comprometedora é um bandido.
A moça também é modelo e está ganhando o dinheiro dela de forma honesta, até que provem o contrário. Bandida é a Relish que se deu bem na época, por fazer uma campanha-retaliação ao caso Cesari Battisti, o terrorista italiano que recebeu refúgio no Brasil (alguém lembra? Porque tem coisa que é melhor esquecer).

3 – A polícia (sua imagem, seu poder e seus recursos) não pode ser utilizada para fins outros não previstos em lei.
A farda na imagem é exatamente igual à da PMERJ. Comprometeram a imagem de uma instituição pública e do Rio de Janeiro em troca de quê? (snif...)

4 – A mulher foi representada numa atitude de forte conotação sexual, abusiva e que estimula a violência, a desigualdade e o desrespeito.
O ingênuo executivo machista da marca italiana da discórdia, senhor Alessandro Espósito, já pediu desculpas e a gente deixa barato a palhaçada.

5 – Não se deve achar que a fragilidade na aparência do inimigo signifique ausência de perigo.
Abaixe a guarda e você pode ser pessimamente surpreendido. O inimigo do “policial” que simula uma busca pessoal toda errada, pode ser a sensualidade da moça. Mas descobri que há mais inimigos sedutores na atividade policial do que poderia eu imaginar na minha vã filosofia (ui!).

6 – A presença feminina é imprescindível na polícia, pronto e acabou.
O blog é meu e eu puxo sardinha para o meu prato a hora que eu quiser. Isto posto, é um erro pensar que a atividade policial é “coisa pra homem”. Eu sou feliz aqui, tá? E busca pessoal em mulher é só uma das muitas situações onde convém a presença de uma policial. Até uma grife de moda italiana já sabe disso.

7 – Por último, quem tem que julgar é o juiz, aprovado no concurso da magistratura, possuidor de competência legal, capacitação e blá, blá, blá e mesmo os juízes são passíveis de erro. É preciso colocar os preconceitos à parte para um julgamento correto, ileso. Quem nos induziu a acreditar que os sete erros seriam do “policial”?

Agora reflitam... ou não, porque esse negócio de ficar apontando os erros dos outros é chato, né? : p

quarta-feira, 21 de abril de 2010

Agora é a minha vez.


Ele tinha bastante experiência e muita classe. Fiquei fã desde o início. Me sentava sempre no meio da primeira fileira e quando ele precisava de alguma coisa pedia pra mim. Eu atendia por prazer, sem necessidade de algum sentido. Distribuía as cópias, recolhia material, ajudava com a papelada, fechava a porta da sala. E sem muito esforço ele foi o meu pai durante todos aqueles meses de curso de formação. Às vezes acho que me protegia - jeito perigoso de amar. Assim que terminou a formatura, esse instrutor pediu pra turma se reunir uma última vez na sala de aula. Subiu no tablado e nos colocamos em pé ali, de frente pra ele. Havia preparado um discurso latejante de despedida e imprimiu toda a sua alma numa folha de papel. A voz dele em sotaque gaúcho foi ficando mais grave e embargada. Disse coisas muito doloridas sobre a realidade do sacerdócio policial que a gente estava prestes a assumir. E chorou. Tentou continuar a leitura e chorou mais ainda. Alguns colegas olharam pra mim e eu entendi. Me aproximei, fiz um carinho no braço dele daquele jeito que só as pessoas que sentem paz sabem fazer e pedi pra ele me deixar terminar de ler o texto. No final da leitura me agradeceu envergonhado com os olhos vermelho-colorado, porque até as cores dos olhos dele eram gremistas. Dei um abraço nele e a turma toda fechou desorganizadamente unida em cima da gente. Naquela fina alegria vencedora que faz a gente acreditar que a partir de agora a história vai ser diferente. Porque vai.

quinta-feira, 15 de abril de 2010

A fera em questão.


Meu presente de aniversário pra você, amorzinho! Advinha???

a) Uma festa surpresa na nossa cidade de origem reunindo nossos amigos que ficaram lá;
b) Um jantarzinho romântico no nosso restaurante charmosinho;
c) Te dar aquele presente na cama na manhãzinha do grande dia (oi?);
d) Marcar a data glamourosamente pra sempre fazendo amor em algum cenário inusitado;
e) Alguma outra coisa que te convença forte que realmente valeu a pena vir atrás de mim;
f) Nenhuma das alternativas anteriores porque estarei viajando a serviço.

quinta-feira, 8 de abril de 2010

Só as mulheres sangram.

Quando nos apresentaram oficialmente, esta espingarda calibre 12 me deu oito coices no peito e uma lembrança roxa como um aviso do tipo "Nunca será!". Me lembro que um dos instrutores viu uma maldita lágrima rolando, mas não fez comentários. Nem eu. Fechei-me dura como quem fecha a câmara da arma após inserir o cartucho. Cleck, cleck! E terminei a série com a calma de um vento brando, camuflando as dores e o orgulho ferido. Mas para minha surpresa, permaneci irredutível no propósito de não desistir. Outro dia chamei esse canhão para um novo acerto de contas no estande de tiro. Veio com a mesma história e a briga foi feia. Até a chuva engrossou comigo naquele dia. Toda vez que eu tentava aconchegar melhor o recuo da arma no meu corpo era uma pancada, que em cima de outra pancada, potencializava o sofrimento. Como se quisesse abrir meu peito na marra. Juro que tentei entender a teoria mecânica e ensaiei várias vezes uma posição mais confortável, mas não adiantava argumentar com aquele trambolho. E quanto mais eu tentava obstinadamente trazê-lo pra perto de mim, mais o armamento me insultava. Foi quando cometi o erro de chegar perto demais, não sei se pra provar que não tenho medo, ou pela ânsia de ser levada a sério. Meus lábios quase tocaram a coronha. Mania de ignorar limites. E não houve perdão. O tiro foi perfeito, mas a desgraça do recuo veio como uma bicuda de coturno na minha boca que me fez ver todas as estrelas do firmamento dançando frevo e curtindo com a minha cara. O lábio superior sangrou... ficou inchado... e, como tantas mulheres que apanham da vida, simplesmente disfarcei, engoli o sangue e abafei a humilhação.