domingo, 30 de junho de 2013

Controle de pânico.


Acho que aquilo era um teste, um pré-requisito pra passar para a parte de exercícios reais. Ninguém disse que era, mas o próprio nome do exercício já era indicativo: Controle de Pânico. Como assim controle de pânico? São situações onde você tem que aplicar uma técnica aprendida, porém num contexto de estresse, onde sua determinação, coragem, e o autocontrole emocional são avaliados.  Enfim, nas entrelinhas eles ensinam que controlar seus próprios medos pode te dar aqueles preciosos segundos que poderão salvar sua vida. Por falar em entrelinhas, descobri que não tenho claustrofobia. Ok, tenho pavor de rato, de sapo, de cobra, do Aécio ganhar as eleições pra presidente mas claustrofobia não é problema meu! Basta ver o tamanho do meu apartamento.
Outra coisa importante que tenho aprendido aqui é que militar têm uma verdadeira compulsão por organização. Por exemplo, eles têm checklist pra tudo. Particularmente, me amarro no passo-a-passo pra você seguir antes, durante e depois das ações. Aqui o certo e o errado estão sempre muito bem definidos. Assim, minhas poucas dúvidas basicamente giram em torno dos termos e expressões militares que desconheço. O resto é tudo muito claro.
Na minha polícia definitivamente não é assim. Temos um sério problema chamado falta de padronização de procedimentos. Um chefe quer que você faça de um jeito, o outro quer que seja feito diferente e na grande maioria das vezes, pasme... você faz do jeito que acha melhor! Se deu certo, era sua obrigação fazer dar certo; se deu errado a culpa e a responsabilidade são inteiramente suas. Entendeu agora todo esse meu medo de errar? Pois é, sinto que é como se eu tivesse a obrigação de já tomar posse no cargo sabendo! Afinal, quantos anos eu estudei para o concurso? Quanto tempo eu fiquei estudando e treinando na Academia?
Bom, não criemos pânico, mas, se é do seu interesse, as matérias da Academia e do concurso público não foram nem 10% do que tive que aprender, "no tapa", em meus poucos anos de polícia e isso é grave, porque a maioria dos antigões experientes estão se aposentando agora e vão levar com eles todo o know how adquirido em toda a sua carreira policial. Neste caso, quem aprendeu com eles ali na tradição falada, ótimo. Quem não aprendeu, não aprenderá mais. 

sábado, 22 de junho de 2013

Mulher de fases.


Passamos da fase delicada de adaptação, assim, já me sinto um pouco mais à vontade com eles e eles comigo. Fizemos ótimos progressos e tudo indica que estamos no caminho certo. Aquela desconfiança mútua dos primeiros dias já passou. Ninguém aqui quer tomar chá vermelho no meu crânio, pelo contrário, eles se sentem orgulhosamente honrados por eu estar querendo aprender com eles. Querem que eu goste do curso e seja aprovada. Estão conseguindo. 

A turma é toda composta por jovens profissionais que têm os mesmos objetivos que eu: novinhos oficiais (todos Tenentes) e novinhos praças (todos Soldados). Boa parte dos instrutores são Sargentos e um ou dois são Capitães. A maioria das alunas são Tenentes. Não sei se é espontâneo ou se lhes deram essa ordem, mas são elas que cuidam de mim e não me deixam fazer besteira. São muito aplicadas e realmente estão dispostas a estudar. Almoçamos juntas,  saímos no final de semana, olhamos revistas de noivas  enquanto tomávamos café e comíamos pães de queijo que nós mesmas fizemos na casa de uma delas. Temos uma noiva - muito linda - no grupo!

Somos mulheres que têm algumas afinidades entre si, mas de vez em quando nossas diferenças profissionais afloram e o clima fica um pouco tenso.  Uma delas carrega o peso da medalha de primeira colocada geral em seu curso de formação. Imagine o que é suportar o ódio de um pelotão de jovens oficiais tendo que engolir uma mulherzinha como a melhor e mais competente aluna do curso deles. Ela é do tipo que não pode errar, logo quer exigir o mesmo dos outros. Tanto que quase caí pra trás quando ela deu uma retumbante patada num colega soldado-aluno que na minha visão só estava querendo ajudar, coitadinho... Pela minha cara de "focaisthis???" uma delas achou por bem tentar me explicar, porém não me olhou nos olhos enquanto falava. Ouvi, claro, mas... não deu pra camuflar o mal-estar de ver o colega saindo todo desconcertado.

Não posso deixar de fazer as comparações que pretendia evitar desde o início. Na minha polícia, chefe é chefe, como em qualquer lugar do mundo, mas curso é curso e nos três cursos que já fiz internamente (quatro com o Curso de Formação) só tinham duas classes de pessoas: ou você é aluno ou você é professor. Já aqui, a patente do aluno tem que ser respeitada até no trato informal entre os mesmos!  Esse foi o problema: o fato de ele tê-la tratado como colega e não como alguém superior na hierarquia militar. Não sei o que dizer. Esperar a próxima fase.
 

segunda-feira, 17 de junho de 2013

As próprias limitações.

 
Logo na primeira semana tive que pagar dez flexões de braço, na frente de toda a turma, porque tinha descuidado de um equipamento. Tinha que ser eu! Os oficiais alunos sentiram um certo desconforto pelo fato de o instrutor me punir assim, como se tal prática fosse apenas para militares. Eu soube disso porque o mesmo instrutor que me fez pagar veio no dia seguinte me pedir desculpas... "Quê isso Sargento..." respondi, "Imagina! Estou me sentindo em casa (mentira). Na minha Academia é pior porque muitas vezes se um aluno erra, todos pagam, inclusive os professores... (verdade)".

Ah, gente, na boa... dez flexões não são nada perto do que estou me preparando pra enfrentar no decorrer deste curso. Olhando a grade curricular que nos foi distribuída, já estou pensando em como vou fazer pra vencer algumas sérias barreiras pessoais. Mas estou feliz porque acho que não tem nada que eu queira mais em termos profissionais do que me capacitar e estar apta a fazer um bom trabalho para o qual já sou paga. É um privilégio enorme poder vencer, com fé em Deus, as próprias limitações. Olhar pra trás e ver que elas nem eram tão grandes como supostamente se apresentavam.
 

domingo, 9 de junho de 2013

A caserna.

 
Sou a única aluna "civil" neste curso. O volume exagerado da apostila que preciso devorar me deixa feliz. Como se conseguisse me fazer acreditar que é possível vencer esse medo de não ser capaz na hora do pesadelo.

O curso é todo em formato militar. É ministrado dentro de um quartel. Tem provas teóricas, práticas e atuação em situações reais na rua onde também serei avaliada. Sim, operações de verdade acontecendo no mundo real! É disso que estou falando! Porém, se eu falhar, vou virar estudo de caso como "a policial que foi reprovada no curso dos militares". Vira essa boca pra lá, ô... Freddy Kruegger! Isso dói no ego, sabia?

Pra piorar a minha situação, a maioria destas matérias que estou vendo aqui, praticamente pela primeira vez, é arroz com feijão para os demais alunos do curso. Portanto, vou precisar de muita humildade, diplomacia e jogo de cintura, pra conseguir toda a ajuda possível dos meus colegas, porque Freddy me diz que, do contrário, eles vão tomar chá vermelho no meu crânio.

O curso é na casa deles. Os alunos participam das "formaturas" que são uma espécie de briefing, uma reunião formal no início das atividades diárias da vida de um quartel. Então, já aprendi por conta própria algumas coisas sobre ordem unida, cultura militar, patentes militares, o que significam aquelas estrelinhas e botõezinhos... E não pense que é simples porque essas coisinhas mudam de instituição para instituição. Tem também toda uma etiqueta militar que é uma coisa de louco... Mas enfim, pessoas normais assumem logo que não são militares e dane-se, eu tenho altas fantasias de que sou uma agente infiltrada na "caserna" levantando informações com os melhores do ramo. Então meu plano é me entrosar com os "milicos", trocar figurinhas, conquistar o meu "brevêzinho", aprender essa porcaria toda e ter segurança para operar na hora do pega. Brasil!