domingo, 28 de setembro de 2014

Pra cho-car a sociedade.


Quando cheguei aqui neste setor, tive que descobrir praticamente sozinha como trabalhar. Isso é muito normal por aqui, e, não vou omitir, aconteceu em quase todos os lugares por onde passei na polícia. Praticamente não houve passagem de serviço ou da carga de equipamentos, et cetera et al. Por que isso, comunidade? Cara, eu acho que a Administração pensa mais ou menos assim: "você passou num concurso punk desses, sobreviveu a um curso de formação parrudo, então sabe se virar muito bem..." E a vida ri da minha cara.

Curiosamente, a única coisa que me deram quando cheguei aqui pra trabalhar foi uma apostila nada engraçada contendo a legislação aplicável à área. Sério. Minha chefa ou qualquer outro colega só entravam no circuito quando eu provocava com alguma dúvida. Nos primórdios, era tanta informação nova que eu tinha que anotar. Tantos detalhes, e minúcias, e exceções. Assim, tudo o que eu aprendia no tapa ia para o meu roteiro particular de análise de documentos. Acho que manjei uns checklists bacanas (influências militares). Aos poucos, errando aqui e acertando ali, fui traçando um roteiro, um verdadeiro "mapa do caminho das pedras" que não tinha no Google Maps. Quando a minha nova tropa de contratados chegou, apresentei-lhes os checklists e tudo fluiu sem traumas. A vida me encara séria, às vezes.

Agora, nossa chefa quer reunir todos os nossos "clientes policiais", nossos colegas que trabalham na ponta dessa área aqui, e vamos mostrar pra eles onde podem melhorar. Assim, além do consumo interno, a gente agora vai exportar nossos checklists. Bonitinho, né?

(Entenda o caso: os policiais da ponta mandam pra gente o fruto do trabalho deles e os errinhos são tantos que às vezes a gente precisa, inevitavelmente, devolver a papelada toda pra fazerem tudo de novo... Um vergonhoso desperdício de tempo, dinheiro público e energia. Mas agora os nossos problemas acabaram).

Vamos reunir nossa "clientela" num lugar mais que especial... É. E esta que vos escreve será uma das palestrantes no evento!!! Eu. Que escrevo estas mal digitadas linhas para os senhores. Serei pa-les-tran-te. Num evento. Policiaaaaaal. Queria tanto que o nível da polícia não decaísse a esse ponto.

Resta-me sorrir pra vida em "Sol Lamento", disfarçando o frio na barriga.

quarta-feira, 17 de setembro de 2014

Fim de expediente.


Agora que passei a ser chefinha com gratificação e tudo, ganhei uma sala pra chamar de minha, a qual divido com um assistente estagiário superlegal. Era pra ser uma vantagem fantástica, afinal, um novo escritório é um símbolo moderno do progresso na carreira de uma pessoa. Além do que, aquela outra sala era barulhenta demais, parecia uma feira. Só que não. Eu fico sozinha à tarde porque o estagiário só trabalha no período da manhã. E qual seria o maldito problema de ficar sozinha? Simplesmente não posso ficar nem um segundo nesta sala após o expediente porque tem um delegado antigão metido a galanteador aqui! Blé.

Pensando seriamente em trazer o Bush meu fuzil preferido pra me fazer companhia. 

quarta-feira, 10 de setembro de 2014

Chegar chegando.


Hoje acordei mais antiguinha. Chegaram dois novinhos aqui pra trabalhar com a gente. Mais novinhos do que eu e, estremeçam antigões que não querem nada com nada, os dois já chegaram assumindo chefia! Quem não faz, leva, tá.

Dois agentes: um do sexo masculino e uma do sexo feminino. Esta, também é natural do Estado em que nasci.  Vieram a fim de substituir o pessoal que estava querendo sair. A chegada de novos agentes significa que eu terei a preferência quando quiser pedir pra trabalhar noutro local. Eu, meditando... sob arrepios de antiguidade.

A Dama de Ferro também aproveitou a "dança das cadeiras" e assumiu uma chefia de ferro na polícia, longe daqui. Eu acho que ela é a primeira mulher a assumir um posto desses. E toda a Terra se alegrou. Porém, para o lugar dela veio um outro delegado muito queimado no quesito relacionamento com os subordinados. Houve choro e ranger de dentes. Como eu conheço a minha tropa, já tratei de investigar. Mas a única coisa que percebi é que o cara é exigente. Bom, exigente eu também sou. Se fosse só isso, a gente iria se dar muito bem.

Só que, ele deixou bem claro que não quer a amizade de ninguém, mas competência. Fico pensando, por que não os dois? Por que eu não posso ter razão e ser feliz concomitantemente? Porque o chefe-sem-amigos disse que é assim que vai ser. Ótimo, então também não sou eu quem vai passar a mão na cabeça dele, ora essa. 

Na primeira missão importante (e cheia de cascas de banana) que ele passou pra mim, eu amarrei todos os detalhes pra que depois ele não me venha acusar de incompetente, de desidiosa, de irresponsável. Essas coisas que os chefes carreiristas e amantes das estatísticas fazem e nos causam tanto mal. Se o padrão de qualidade dele é alto, o meu será Pico Everest Level. Sério, vou deitar o cabelo.

Tanto que meu relatório foi ilustrado com fotografia profissional, desculpa, ok? Chamei o meu antigo e querido ex-chefe aposentado, Roger Murtaugh, pra me dar uma mão. Ele veio vibrando (o trabalho dele na iniciativa privada, não decolou, infelizmente...) Relatório pronto, mandei para o novo chefe-sem-amigos. In relatorium veritas ipsis literis... Mas não era mesmo, o tipo de verdade que ele queria ler ali. Tô nem aí! Latim combina demais com esse meu novo estado de antiguidade policial. Obrigada. 

Com essa experiência, aprendi uma coisa importante. A polícia não é dos espertos, nem dos delegados, nem dos bairristas, nem dos antigões, nem dos puxa-sacos, nem dos mais competentes e preparados. A polícia é de quem tem amigos.