terça-feira, 20 de junho de 2017

Repercussões.



Uma colega, também novata, teve um probleminha em sua primeira viagem a serviço aqui neste novo setor. Acho que ela entendeu erroneamente que a situação estava dominada e baixou a guarda. Ninguém se feriu, mas o fato repercutiu muito rápido.

Ela vai ficar um tempo "na geladeira" por conta desse incidente até se acalmarem os ânimos. Foi bem estranho terem-na tirado da escala sem avisar ou explicar que estavam fazendo isso para o seu próprio bem. Ela ficou mal. Foi bem desagradável essa história, mas não estou tomando as dores da colega não, reconheço que foram generosos em não tê-la feito voltar para seu local de trabalho original, porque fomos avisadas que isso poderia acontecer quando chegamos.

O fato do incidente ter acontecido com uma novata fez com que todo o universo voltasse os olhos para o segmento feminino do setor. A pressão aumenta consideravelmente, porque as mentes feudais questionam se essa função deveria ser mesmo realizada por mulheres.

Aprendi que somos mais cobradas que os homens. Os erros deles são tantas vezes considerados incidentes bobos de percurso, uma coisa normal da vida, quase um charme da profissão. Não é assim quando uma policial erra. Os comentários são maldosos, paradoxais e querem questionar a essência da nossa competência para o trabalho policial, seja a colega recém-chegada, antigona ou candidata.

E como se não bastasse, tudo isso alimentou a fogueira das vaidades das colegas mais antigas, que agora questionam a qualidade desse último recrutamento, discussão essa que, claro, lhes traz um certo star quality. É impressionante.

terça-feira, 6 de junho de 2017

Ambiente hostil.


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Boa noite pra você que tomou duas patadas e um gelo de oito longas horas num único dia de trabalho e bem-vindos ao maravilhoso submundo obscuro dos outsiders da polícia.

- "Mas Novinha, você mandou essa pessoa ridícula para o inferno ou apenas para o raio que a parta?" - pergunta o leitor dos meus pensamentos, desejoso de uma resposta à altura do esculacho que levei.

Calma amigos, porque antes de falarmos das relações brancaleônicas de poder no nosso já desbotado serviço público, informo que essa foi minha primeira operação com esta policial que chamaremos de Cercei Lannister. Na verdade ela não está na mesma missão que eu e a maioria das outras meninas. Minto. Ela está, mas o departamento dela é outro, a função dela é totalmente administrativa e nem arma ela usa.

Agora quero deixar claro que, por eu ser, na maioria das vezes, muito discreta, não estou exposta normalmente a esse tipo de agressão, mas dependo do trabalho dela... Eu pre-ci-so perguntar!

Olhando pelo lado bom da situação, agora saímos da zona da mera especulação para a certeza de que é oficial: estamos num ambiente hostil e iremos atuar nessa medida (é assim que se faz, Hannah Baker).

Não, amigos. Isso não é uma construção do meu hipotálamo, não, tá? O clima aqui não está legal e tem alguma coisa pegando, sim. Havia uma outra colega na cena, até então muito séria e fria como uma rocha, Paulina (nome fictício), que comentou na volta comigo: - "Nossa, não entendi porque ela te tratou daquele jeito". E numa grande oportunidade de ganhar minha primeira aliada na rebarba desse acontecimento... eu fiquei absolutamente calada.

  • primeiro porque se Paulina não entendeu, muito menos eu! 
  • segundo, porque Cercei tem uma considerável influência política junto às chefias do último escalão.
  • terceiro porque Cercei não deixa de ser uma referência forte para as outras policiais que, né, precisam de uma prótese na liderança feminina, devido à saída de Beatrix Kiddo.
  • quarto porque Cercei é do mesmo curso de formação de boa parte das meninas deste setor, o que, em tese, gera entre elas aquela afinidade espontânea. 
Assim, não vou dizer que fiz um voto de humildade franciscana, mas se o silêncio é o santuário da prudência, como apregoa o jesuíta espanhol Baltasar Gracián, é pra lá que eu vou! Ora, se Paulina quer entender Cercei, por que não perguntou a ela?

Aqui pra nós, eu até entendo que seja normal, embora anti-estético, que um policial novato seja tratado com uma certa frieza nos primeiros meses de trabalho pelos mais antigos até ganhar a confiança deles sobre a nossa capacidade, mas aprofundando um pouco mais a leitura, a pergunta que me vem é: em quê, afinal, consiste realmente essa desconfiança dark opressiva dela?

(Como é que eu vou saber, mundo cão?!?)

De qualquer forma, eu não cheguei aqui capinando sentada, né? Ninguém tem ideia da ralação e da honra que é pra mim estar aqui. Esta figura vai aprender a me respeitar naturalmente, porque o trabalho dela também depende do meu.